Conhecer e cuidar dessa montanha-russa neuroquímica que afeta organização, impulsividade, emoções e produtividade pode ajudar a ter uma vida mais feliz e tranquila
Manaus (AM) – Na correria do dia a dia, acabamos nos habituando a realizar várias tarefas ao mesmo tempo. Desde várias abas abertas no computador às inúmeras notificações ‘pipocando’ sem parar no celular, pessoas chamando para uma nova reunião, prazos a cumprir e uma nova tarefa que chega e exige concentração. Para lidar com tantas atribuições, é necessário criar estratégias para ter foco e tentar cumprir todas as tarefas, o que para muitos adultos com Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH) é uma difícil e angustiante realidade diária.
O TDAH é frequentemente associado à infância, mas pode impactar a vida adulta de maneiras inesperadas e, conforme explica o médico psiquiatra Pablo Gnutzmann Pereira, da Unidade de Clínica Médica do Hospital Universitário Getúlio Vargas (HUGV-Ufam/Ebserh), o TDAH é um transtorno do neurodesenvolvimento que surge na infância e, muitas vezes, não é detectado nessa fase. “O indivíduo vai descobrir que tem TDAH só na idade adulta. Uma das características principais é a dificuldade em manter o foco assim como permanecer numa atividade que considera mais ‘chata’. A rigor, ele começa projetos e não consegue finalizá-los”, ressalta.
Gnutzmann explica a diferença entre ter TDAH e ser distraído: “A distração comum não gera prejuízo, e o que diferencia um do outro é o tamanho do prejuízo. Ao observar a trajetória do paciente, verifica-se que ele não consegue concluir atividades a que se propõe, gerando problemas no trabalho e em outros setores da vida”.
Uma corrida contra o relógio
A pessoa diagnosticada com TDAH passa por uma montanha-russa neuroquímica que afeta organização, impulsividade, emoções e produtividade. Por isso, é importante que o diagnóstico correto seja feito por meio de um anamnese (entrevista) com um profissional médico especializado, que pode ser um psiquiatra, um neurologista ou um neuropediatra.
Gnutzmann afirma que adultos com TDAH frequentemente enfrentam dificuldades com prazos e procrastinação. A ironia? Muitos só conseguem realizar tarefas sob pressão extrema. O problema é, muitas vezes, confundido com ansiedade, depressão e desatenção, por isso é fundamental a diferenciação feita por um especialista.
Por outro lado, a dificuldade em administrar o tempo pode gerar um ciclo de frustração. O relógio parece funcionar de maneira diferente: cinco minutos podem se arrastar como uma eternidade, enquanto três horas voam sem aviso, como relata a funcionária pública Joana (nome fictício), 33, solteira e sem filhos, que faz tratamento psiquiátrico no ambulatório do HUGV-Ufam e diagnosticada, ano passado, com TDAH.
“Fui chamada muitas vezes de irresponsável, porque eu conseguia fazer algumas coisas e outras não. Especialmente nos estudos, eu que sonho em me formar em Psicologia, tenho dificuldade em entender o que os professores do meu curso falam. Não consigo me organizar para o estudo, perco prazos de entrega de trabalhos, enrolo para sair para o trabalho e sempre acabo chegando atrasada... Meu dia a dia é totalmente desorganizado! Não tenho organização nem disciplina em tudo! O esquecimento também atrapalha muito”, ressalta, Joana, com tristeza.
Ela destaca também a falta de informação e de preparo das pessoas para lidar com o problema. “Há muita desinformação sobre o TDAH. Vejo, na própria instituição onde estudo, que os professores não têm paciência. Isso me trava, porque eu não consigo dizer que tenho esse problema e que preciso de um tempo diferente para aprender. Já pensei até em trancar a faculdade”, reflete.
Emoções a todo o vapor
O cérebro hiperativo está sempre buscando novas conexões, ideias e soluções inovadoras. É comum que pessoas com TDAH tenham várias paixões e interesses, mas dificuldade em levar projetos até o fim. Além disso, o TDAH não afeta apenas a atenção, mas também a regulação emocional. Pequenas frustrações podem ser avassaladoras, enquanto momentos de alegria são vividos com intensidade extrema. Essa montanha-russa emocional pode ser exaustiva, mas também torna as relações humanas mais autênticas e profundas.
Com o diagnóstico correto e estratégias adequadas, o TDAH pode se tornar um aliado. Métodos como body doubling (ter alguém por perto enquanto trabalha), técnicas de gerenciamento de tempo e até mesmo medicação podem ajudar a transformar desafios em oportunidades.
O médico psiquiatra Gnutzmann diz que o tratamento do TDAH é multiprofissional e o uso de medicação é benéfico. “A eficácia do tratamento medicamentoso está entre 80% e 90%, o que faz muita diferença junto com uma reabilitação, com melhoria da capacidade de organização e estabelecimento de metas, que aliada a uma alimentação equilibrada e atividades físicas, vão favorecer questões cognitivas e estivo de vida”.
Adultos com TDAH não precisam tentar se encaixar no modelo tradicional de produtividade. O segredo é aprender a dançar no ritmo único do próprio cérebro – e transformar a bagunça mental em um espetáculo de criatividade e inovação.
Sobre a Ebserh
O HUGV-Ufam faz parte da Rede Ebserh desde 2013. Vinculada ao Ministério da Educação (MEC), a Ebserh foi criada em 2011 e, atualmente, administra 45 hospitais universitários federais, apoiando e impulsionando suas atividades por meio de uma gestão de excelência. Como hospitais vinculados a universidades federais, essas unidades têm características específicas: atendem pacientes do Sistema Único de Saúde (SUS) ao mesmo tempo que apoiam a formação de profissionais de saúde e o desenvolvimento de pesquisas e inovação.
Por: Aretha Lins da Unidade de Imprensa e Informação Estratégica da Ebserh para as regiões Norte e Nordeste
Fotos: Assessoria de Comunicação / (HUGV-Ufam)
Fonte: Aretha Lins / Jornalista